Pressão amplia exposição e riscos de motociclistas e caminhoneiros
MOTOCICLETAS
A expansão da frota de motocicletas no país a partir do final da década de 90 e início dos anos 2000 veio acompanhada também do aumento no número de mortes de ocupantes de motocicletas, sejam eles condutores ou passageiros das motocicletas – é o que mostra o gráfico da Figura 1, com a evolução das mortes de ocupantes de motocicletas no países desde 1996 até 2013, segundo estatísticas oficiais do Ministério da Saúde. Os ocupantes de motocicletas são quase 30% de todos os mortos em acidentes de trânsito no país, de modo que em alguns estados esse percentual pode ser bem maior. É interessante notar que, devido ao crescimento da proporção de motocicletas na frota, as mortes de ocupantes de motocicletas seguiram uma tendência de crescimento mesmo após a implementação do então novo Código de Trânsito Brasileiro a partir de 1998, ao contrário das mortes em outros modos de transporte.
Figura 1: Evolução das mortes de ocupantes de motocicleta entre 1996 e 2013
As motocicletas, por si só, já são um veículo de alto risco associado, pois exigem, além das tarefas normais de condução de um veículo, a manutenção do equilíbrio sobre duas rodas. Não há como modificar esta característica sem que a motocicleta deixe de ser uma moto, em outras palavras, não há o que fazer quanto a isso. Além disso, há outras desvantagens desse veículo em relação à segurança, como por exemplo o fato de em uma colisão ou choque com objeto, o corpo dos ocupantes da motocicleta atua na absorção do impacto do acidente juntamente com o veículo, pois a motocicleta não oferece nenhum tipo de proteção aos seus ocupantes – isso aumenta em muito o risco de ferimentos graves/fatais. Outra desvantagem em termos de segurança são as próprias características de tamanho e flexibilidade de manobras permitem que os motociclistas executem manobras de risco no trânsito;
Em contrapartida, com o intuito de compensar tais desvantagem em relação à segurança, é fundamental a utilização dos equipamentos de segurança por parte dos ocupantes, assim como a manutenção de uma velocidade segura, a qual é decisiva quanto para evitar que um acidente ocorra tanto para que suas consequências sejam menos graves. Além disso, sempre importante é o nível de educação/cultura de segurança no trânsito dos condutores e passageiros de motocicletas.
Apesar das motocicletas predominarem no meio urbano (o que representa um risco não só para os motociclistas, mas também para os pedestres/ciclistas que podem ser atropelados por motocicletas), é importante destacar a total incompatibilidade deste veículo com o tráfego rodoviário. Um primeiro motivo é o mais elevado limite de velocidade das rodovias, pois as características já mencionadas de necessidade de equilíbrio e vulnerabilidade da motocicleta têm suas consequências agravadas quanto maior for a velocidade em caso de acidente. Outro motivo é que o ambiente rodoviário possui maior proporção de fluxo de veículos pesados (caminhões e ônibus) que o meio urbano, o que aumenta as chances de um motociclista vir a colidir com um veículo de massa muito maior que a sua, o que reduz drasticamente as chances de sobrevivência em caso de acidente.
CAMINHÕES
Quanto às mortes de ocupantes de caminhões, apesar de certa tendência de crescimento observada a partir dos dados do Ministério da Saúde no período 1996-2013 (Figura 2), há uma maior flutuação dos números ao longo dos anos. De forma geral, também há certa relação com o aumento da frota de caminhões no país.
Figura 2: Evolução das mortes de ocupantes de caminhões entre 1996 e 2013
Acidentes fatais envolvendo caminhões, nos quais o próprio ocupante veio a óbito, são eventos típicos de rodovias, que concentram a maior parte do fluxo de caminhões. Devido à estrutura de proteção oferecida pelo caminhão, é pouco provável que um ocupante de caminhão venha a óbito em uma colisão com um veículo de menor porte, como um automóvel, por exemplo (supondo que o ocupante do caminhão esteja utilizando o cinto de segurança). A partir disso, tem-se que grande parte dos acidentes fatais com caminhões tendem a ser acidentes com um único veículo, no caso, o caminhão. Esses acidentes ocorrem devido à perda de controle do caminhão, que por sua vez pode ter uma variedade de fatores determinantes, tais como:
Além dos perigos para os próprios condutores de caminhões, que dirigem por longas distâncias durante muitas horas em rodovias e veículos nem sempre adequados, a presença de uma elevada proporção de caminhões na composição do fluxo de tráfego representa um risco para os demais veículos, os quais, em caso de colisão com um caminhão, suportam maior parte do impacto e são muito mais suscetíveis a ferimentos graves/fatais.
A incompatibilidade tanto de tamanho quanto de massas dos veículos em rodovias constitui sério risco de ferimentos graves em caso de colisão.
A diferença de tamanho é importante porque a parte do veículo preparada para receber o impacto de uma colisão (para-choques, por exemplo) deve, tanto quanto possível, coincidir com a mesma parte do outro veículo envolvido na colisão, de modo que a estrutura de proteção de ambos veículos atua na preservação da integridade física de seus respectivos ocupantes. Quando as partes preparadas para receber o impacto não coincidem na colisão, o elemento que foi projetado para proteger a integridade físicas dos ocupantes de um veículo, acaba por representar um fator de risco de ferimento para o condutor do outro veículo envolvido na colisão.
A compatibilidade das massas dos veículos envolvidos em uma colisão também é importante, pois os ocupantes do veículo de menor massa absorvem maior parte do impacto em caso de colisão.
Essa é a situação típica que ocorre quando um automóvel colide com um caminhão, tendo em vista que esses dois veículos diferem tanto em tamanho quanto em massa.
Se pensarmos no conflito “caminhão x motocicleta”, tais considerações tornam-se ainda mais imperativas.
CONCLUSÕES
Condutores de motocicletas e caminhões têm algo em comum, ambos podem exercer atividades profissionais de transporte e conduzirem sob pressão. Isso faz com que a exposição (quantidade de quilômetros percorridos) desses indivíduos seja muito maior que a de um condutor comum; uma maior exposição no trânsito leva aumenta as chances de lidar com situações de risco no trânsito, o que os garante uma maior experiência. Essa experiência, apesar de positiva, pode afetar os mecanismos de aceitação do risco desses condutores, que podem acabar por se sujeitar a mais situações de risco que um condutor normal se sujeitaria. É o popularmente chamado “excesso de confiança”.
Por fim, outro ponto importante, agora em termos políticos e estruturais, mudanças na matriz de transporte de carga, por exemplo, com a ampliação rede de ferrovias, tem o potencial de minimizar este problema em sua raiz, reduzindo significativamente a exposição (quilometragem percorrida) em caminhões nas rodovias brasileiras, que além dos benefícios de segurança viária também possui benefícios para a conservação e manutenção dos pavimentos.
A mesma lógica pode ser transferida para a questão da proliferação das motocicletas, que surgiram como uma alternativa aos problemas de mobilidade urbana. A oferta de um serviço de transporte coletivo confortável, rápido, confiável e facilmente acessível é capaz de frear o aumento da frota de motocicletas (e mesmo de automóveis), tornando o transporte urbano além de mais racional, mais seguro.
Tiago Bastos é consultor do Observatório, doutor pela USP (Universidade de São Paulo) e Universiteit Hasselt, na Bélgica, e pesquisador em Segurança Viária
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