Guerras mobilizam nações, dominam manchetes e provocam comoção mundial. Enquanto isso, uma tragédia de proporções equivalentes ou maiores acontece diariamente nas ruas e estradas do mundo: a carnificina silenciosa do trânsito. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 1,35 milhão de pessoas morrem anualmente em acidentes de trânsito – número superior às vítimas de muitos conflitos armados contemporâneos combinados. No Brasil, são mais de 30 mil vidas perdidas por ano nas estradas. Por que, então, não declaramos estado de emergência diante desta devastação cotidiana?
Nas guerras, há inimigos declarados, estratégias de ataque e defesa, e uma clara intenção de ferir. Já no trânsito, não enfrentamos adversários, mas compartilhamos espaço com outros cidadãos comuns – pessoas que, como nós, estão apenas tentando chegar aos seus destinos. A ironia trágica é que, enquanto na guerra a morte é uma possibilidade calculada, no trânsito ela surge como uma surpresa devastadora, frequentemente resultante de decisões banais e evitáveis.
Quando um motorista decide responder a uma mensagem no celular enquanto dirige a 80 km/h, não há intenção de matar. Mas, por alguns segundos de distração, seu veículo percorre “às cegas” distâncias equivalentes a vários campos de futebol. Ali não há bombas programadas, apenas escolhas impensadas.
Em zonas de guerra, soldados e combatentes assumem riscos conhecidos. No trânsito, as vítimas são pessoas comuns em suas rotinas diárias – estudantes a caminho da escola, trabalhadores retornando à casa, famílias em passeio de fim de semana. São mortes que ocorrem em plena normalidade da vida civil, sem declarações formais de hostilidade.
Maria, de 19 anos, voltava da faculdade quando um motorista embriagado invadiu a contramão. João esperava no ponto de ônibus, quando um carro desgovernado subiu na calçada. Histórias como essas se repetem diariamente, transformando estatísticas em tragédias familiares irreparáveis.
Em conflitos armados, a responsabilidade pelas mortes geralmente recai sobre Estados, governos ou grupos armados. Já no trânsito, cada condutor carrega consigo o potencial de vida ou morte. O excesso de velocidade, o uso do celular ao volante, a direção sob efeito de álcool – são escolhas individuais com consequências coletivas devastadoras.
Diferentemente da guerra, onde muitas vezes os cidadãos comuns são impotentes diante das decisões de seus líderes, no trânsito cada um de nós tem o poder – e a obrigação – de evitar a próxima tragédia. Basta uma decisão consciente.
Enquanto conflitos armados acontecem em territórios delimitados, a violência no trânsito é onipresente e democrática – afeta países ricos e pobres, cidades grandes e pequenas. Apesar disso, as câmeras de TV raramente se voltam para este massacre cotidiano, a menos que envolva uma celebridade ou cause um congestionamento monumental.
Mortes normalizadas. A guerra no trânsito não tem fronteiras, não tem cessar-fogo e, pior, não recebe a devida atenção das autoridades e da sociedade. É uma guerra em que os boletins de baixas são diários, mas não geram manchetes proporcionais ao seu impacto.
Quando eclodem confrontos armados, vemos mobilizações globais, campanhas de ajuda humanitária e esforços diplomáticos para restabelecer a paz. Já as mortes no trânsito brasileiro foram perigosamente normalizadas: tornaram-se parte da paisagem urbana, como se fossem um preço inevitável da mobilidade moderna.
O custo humano é incalculável. Famílias destroçadas, sonhos interrompidos, potenciais desperdiçados. E o mais alarmante: segundo especialistas em segurança viária, até 90% destes acidentes seriam evitáveis com medidas simples de prevenção e mudanças comportamentais.
Precisamos repensar nossa relação com o trânsito, compreendendo que cada veículo é um instrumento que pode tanto facilitar nossa vida quanto encurtá-la dramaticamente.
Campanhas educativas precisam ganhar a mesma urgência de alertas de segurança nacional. Leis de trânsito devem ser aplicadas com o mesmo rigor de crimes contra a vida. E, principalmente, cada condutor precisa assumir sua responsabilidade como guardião não apenas da própria vida, mas das vidas que compartilham o mesmo espaço público.
É hora de reconhecer que estamos diante de uma crise humanitária nas estradas e que a solução começa com cada um de nós.
José Aurelio Ramalho
Fundador e Presidente do Conselho do Observatório Nacional de Segurança Viária
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